sábado, 10 de fevereiro de 2018

A Harmonia do Caos em A Serenidade do Zero

*Por Thiago Scarlata
Em A Serenidade do Zero (Penalux, 2018), Alexandra Vieira de Almeida constrói um surpreendente e pressuroso apelo: precisamos voltar ao zero, ao nada.

Para além das resignificâncias do habitual, verve pictórica, quase épica de seus poemas, há neste livro uma gama de signos que não podem ser comentados pela mera via das convenções literárias, estilísticas e de linearidade lógica. Ao invés de respostas morais, acalanto poético pela via do belo (e olha que ela utiliza muito bem seu lirismo, digno de um Bruno Schulz ou uma Adélia Prado), ou a inscrição de perguntas filosóficas meio tachadas, como vemos muito por aí, Alexandra nos dá simplesmente o zero para lidarmos.

O zero da autora é uma espécie de faca que vai, ao longo do livro, cortando absolutamente tudo que é consenso, libertando a língua da relação simbiótica que hoje ela tem com a razão, como podemos notar no trecho do poema Silêncio (pág. 19): “O marasmo das palavras/faz acordar preces/sem um único som”.

Apesar de lidar com o silêncio, o “menor que o pouco” e todo esse relicário de subtrações, a poesia de Alexandra é abundante, deixando a impressão de que cada poema é, na verdade, vários ao mesmo tempo, carregando a cada estrofe e verso uma infinidade de imagens, apontando que sim, há muito que se dizer sobre o nada e a brevidade poética, neste caso e antes de tudo, seria, no mínimo, redundante.

Alexandra é profética, quase apocalíptica. Contudo, ao escrever em A Delicadeza do Silêncio (pág. 32), “O mundo já deu o que tinha de dar”, não faz disto uma ode a pura destruição, mas uma bandeira do antiperfeccionismo, do “homem do outro lado da rua/cúmplice de uma história sem grandes finais”.

Por tudo isso, quando ela escreve “não quero ser o centro nem a periferia/o vazio me basta” em Sem Histórias, Por Favor (pág. 46), não está, dessa maneira, assumindo uma postura “isenta” em relação a sociedade, ao contrário, a poeta se desloca para o núcleo das coisas, onde reside o inaudito. Essa última frase citada, inclusive, me lembrou muito uma contida num dos poemas de Adélia Prado, que diz: “Não quero faca nem queijo/quero a fome”. Essa “fome”, essa “falta” que é o “antes” é a tônica crítica e poética deste belo livro.

Os astrônomos dizem que depois da Grande Explosão, o universo começou a se expandir e não parou mais. Em A Serenidade do Zero, Alexandra propõe o contrário: um Big-Bang invertido em meio a um caos harmonizado regido pela arte, e, encarnando a voz de um menino que conversa com Deus em Gênese do Nada (pág. 69), sacramenta: “A poesia/vem antes da palavra”.



Clique aqui para adquirir um exemplar!



Alexandra Vieira de Almeida é poeta, contida, cronista, resenhista e ensaísta. É Doutora em Literatura Comparada pela UERJ. Trabalha como professora na Secretaria de Estado de Educação  e tutora de ensino superior a distância na UFF. Publicou quatro livros de poesia: "40 poemas", "Painel" (Multifoco, 2011), "Oferta" (Scortecci, 2014) e "Dormindo no verbo" (Penalux, 2016). Neste ano, publicou seu primeiro livro infantil, "Xandrinha em: o jardim aberto" (Penalux).Publica suas poesias em antologias, revistas, jornais e alternativos por todo Brasil e também no exterior. Tem poemas traduzidos para vários idiomas. Tem um blog de literatura: www.malabarismospoeticos.blogspot.com.br




__________________________________________________________





Thiago Scarlata é poeta, músico, escritor e criador/editor do Blog Literário Croqui. Teve poemas traduzidos para o espanhol, publicados em antologias e também nas Revistas Gueto, Escamandro, Mallarmagens, Monolito, Janelas em Rotação, Poesia Brasileira Hoje, Poesia Avulsa, MOTUS, Jornal RelevO, Literatura&Fechadura, além de blogs literários. Foi finalista do PRÊMIO SESC DE LITERATURA 2016 e JAYME ROLDON 2011, e vencedor do CONCURSO MOTUS – MOVIMENTO LITERÁRIO DIGITAL 2017. É autor do livro de poesia “Quando Não Olhamos o Relógio, Ele Faz o Que Quer Com o Tempo” (Editora Multifoco, 2017). croquiliteratura@gmail.com 

Nenhum comentário:

Postar um comentário